domingo, 28 de setembro de 2008

Resenha Ilustrada do livro "O desenho cultivado na criança"

O Desenho Cultivado na Criança: prática e formação de educadores, de Rosa Iavelberg, ed.Zouk, 2006- uma resenha ilustrada

Por Selma de Assis Moura
Especialização em Linguagens da Arte
Centro Universitário Maria Antonia - USP
Sobre a forma desta resenha:

Diante da proposta de fazer uma resenha sobre um dos textos que trabalhamos nas primeiras aulas do curso de Especialização em Linguagens das Artes, escolhi falar de seu livro “O Desenho Cultivado da Criança: prática e formação de educadores”.
Essa leitura veio ao encontro do meu interesse em aprender mais sobre o desenvolvimento do desenho na criança, desafiada pelas produções de meus alunos na educação infantil e de minhas filhas. Esse texto me deu uma base teórica para melhor compreender o que acontece com as crianças em seu processo de criação no desenho e quais são as possibilidades de trabalho do professor, que foi aprofundada nas aulas teóricas que tivemos e na leitura mais detida que fiz depois.

Tomei a liberdade de escrever esta resenha ilustrando-a com alguns dos muitos desenhos que tenho colecionado, e algumas observações pessoais que tenho feito a partir da tentativa de ler esses desenhos com uma maior profundidade. Espero que possamos estabelecer uma troca e um diálogo sobre esses desenhos e minhas reflexões.
Observação importante: Trechos do livro são colocados sob a forma de citações, marcadas em itálico e em cor cinza, para facilitar a visualização e organizar o texto sob a forma de um diálogo com as idéias da autora.

O "Desenho Cultivado"

A palavra ‘cultivado’ no título do livro remete-se à noção de cultura como a de semear, arar, adubar, cuidar e colher, e é ilustrativa da linha que o texto segue: superando a visão tradicional de ensino de arte como mero domínio de técnicas e cópia de modelos, e a visão escolanovista de livre expressão e espontaneísmo, a tese do livro é a de propor uma arte-educação que leve em conta as experiências prévias do aluno, sua vivência cultural, seu conhecimento de mundo, suas habilidades e necessidades, e ajude-o a avançar em seus conhecimentos, "caminhando de níveis de menos saber para níveis de mais saber".
A feliz escolha do termo ‘cultivar’ ilustra bem o trabalho do professor nessa proposta: o de conhecer bem o solo, semear conhecimentos e vê-los crescer e frutificar. Nem tudo está sob seu controle: há o clima, as pragas, os imprevistos. Mas se ele tem conhecimento de seu ofício, muito pode fazer: corrigir o solo, retirar as pedras, criar um sistema de irrigação, colher no tempo certo.

Não há um fruto igual a outro, ainda que todos sejam bons e saborosos. E cada fruto carrega consigo a semente, capaz de gerar outras árvores, outras vidas, em um ciclo cujo fim o semeador sequer vislumbra...

“ Desde a educação infantil podemos propiciar um universo rico de aprendizagens em desenho, expandindo o universo cultural das crianças, trabalho que pode seguir orientado pelas idéias em ação das crianças. Essas idéias, motores dos atos de desenho, são construídas, primordialmente, na prática desenhista e na interação de cada um com a diversidade dos desenhos presentes nos ambientes.”

Na introdução do livro propõe-se uma visão do desenho infantil que foge da idéia de dom, talento ou aptidão, esclarecendo a opção por uma visão construtivista do desenho como “objeto simbólico e cultural, expressivo e construtivo, individuado e influenciado pela cultura”, acessível a todos através do ensino-aprendizagem, que caminha “do pré-simbolismo à construção de poéticas próprias, com marca pessoal e diversidade cultural”. Traça-se um contexto histórico do ensino de desenho na escola, contrastando duas visões: a tradicional e a renovada, com idéias que podem ser sintetizadas no esquema abaixo:

Tendência Tradicional:
Calcada na concepção neoclássica.
Propostas de desenho natural, decorativo, geométrico e pedagógico (para ilustrar aulas)
Didática de cópia de modelos e treino de habilidades, exercícios para fixar pela repetição e aprimorar a destreza motora.
Passos de progressão sucessiva, do mais fácil para o mais difícil, do simples para o complexo.
Não se consideram as diferenças individuais
Ensino centrado na autoridade do professor
Conteúdos: noções de proporção, composição, teoria da luz e sombra, texturas, perspectiva.
Ênfase no produto.

Tendência Renovada
Concepção de desenho como atividade expressiva, livre, e natural da infância;
Didática de exploração livre de materiais e técnicas
Estímulo à imaginação e à criatividade
Liberdade compreendida como qualidade livre de influências do meio
Pensar, sentir e perceber.
Ensino centrado no indivíduo.
Ênfase no processo e no desenvolvimento do potencial criador
Nesse capítulo faz-se também um apanhado histórico dos congressos internacionais de desenho presente na obra Estética e Pedagogia, de Irena Wojnar, que mostra como as concepções de desenho e de seu ensino foram evoluindo ao longo do século XX, rompendo com uma visão onde o aprendizado se dá por introjeção de modelos sem interpretações ou transformações pessoais a um trabalho de criação pessoal. Uma das conquistas destacadas é a visão de erro na produção infantil, que passa a ser considerado parte do processo de desenvolvimento e não como algo a ser corrigido pela intervenção do adulto. Outra conquista é a noção de uma educação estética, ideal da escola renovada e que se torna paradigma para a formação geral do indivíduo.A psicologia e o estudo psicológico do desenho da criança, a partir da segunda metade do século XIX, permitiu que avançássemos em nossa concepção do desenho infantil sob uma perspectiva de criação e de jogo. Com base em Piaget, o texto explicita alguns conceitos de desenvolvimento infantil e seu reflexo na produção dos desenhos:




No período sensório-motor a inteligência da criança é eminentemente prática, a criança assimila o mundo através de suas percepções e não há ainda a possibilidade de representação. Sua produção gráfica expressa o jogo de exploração e imitação que é a pré-figuração. Aos poucos a criança torna-se mais consciente da ligação entre os seus movimentos e os traços no papel, o que a estimula a variar esses movimentos.

"No final do período sensório-motor, segundo Piaget, surge uma função que autoriza representar, tomar uma coisa por outra, diferenciar um significado (coisa, objeto, acontecimento) de um significante (sua representação – linguagem, gesto, imagem mental). O desenho, enquanto símbolo, é representação singular, como o desenho de uma cadeira, feito por uma criança.(...) No sensório-motor a criança não sabe representar, sua inteligência é prática, sabe fazer, age no plano do êxito.”

Figura 2: Tarsila, 3 anos, lápis de cor sobre folha no caderno de desenho


Ao passar das garatujas para as primeiras representações figurativas, a criança mostra uma evolução notável: a percepção de que se pode representar graficamente o real. Ela muda do pensamento cinestésico para o imaginativo, colocando intenção representativa no que desenha, percebendo que outros podem atribuir-lhe significado, e fazendo do desenho uma forma de comunicação com o outro.
"O jogo caminha do jogo de exercício (repetição de ações pelo prazer das sensações e movimentos) para o jogo simbólico, o faz-de-conta que pode ter o corpo como instrumento ou ser projetado em objetos com os quais a criança brinca só ou com seus pares. Na sucessão ocorre o jogo de regras em que os participantes acomodam seus esquemas a uma regularidade que dinamiza a participação de todos”

Os esquemas propostos por Piaget não são sucessivos, mas inclusivos. Em relação ao desenho pode-se dizer que as crianças, mesmo sendo capazes de operar em um nível mais sofisticado, podem sempre recorrer aos níveis anteriores se assim o desejarem. Assim é que Matheus, nesses dois estudos de movimento e formas (desenhos espontâneos feitos por sua escolha em um momento de atividade livre) escolhe não desenhar figurativamente, e uma leitura precipitada poderia ver nesses desenhos garatujas.

A concepção contemporânea de desenho finca suas bases quando, em meados do século XX, psicólogos, antropólogos historiadores, teóricos de arte e educadores partem da documentação e da análise de trabalhos de crianças para, operando em uma perspectiva pedagógica, genética ou psicológica, compreender sua gênese e desenvolvimento. Avançando rumo a pesquisas interculturais e de diálogos dos desenhos com a cultura, começou-se a perceber as constâncias estruturais, ou seja, o que era comum aos desenhos de crianças de vários lugares e tempos, e também as diferenças simbólicas que esses desenhos traziam, delineando as teorias que atualmente sustentam o ensino de desenho.A concepção de desenho na escola contemporânea ou construtivista, defendida pelo livro, parte das necessidades e interesses da criança mas inclui em seu universo a cultura, sem que com isso ela perca sua autoria, seu protagonismo. Através do conhecimento da realidade a criança reelabora seus próprios conhecimentos. Ao dialogar o outro, suas idéias e experiências (seja este outro o colega ao seu lado, o professor ou um artista que se estuda) a criança tem a oportunidade de comunicar suas idéias, ouvir as dos outros, repensar suas próprias idéias e reelaborá-las, avançando assim para um conhecimento mais sólido, sem perder sua marca pessoal.


“Além do conhecimento de si mesma, que a criança tem ao desenhar, ganha compreensão do mundo. Ela desenha porque existe desenho no mundo. Aprende a ver e a executar o que vê. Tende a assimilar níveis de conhecimento e produção artística e estética cada vez mais complexos, agindo sobre os objetos de conhecimento (desenhos) de diversas culturas, tempos e lugares.”


Isabela, aos 5 anos, lápis de cor sobre cartolina

Isabela, aos 7 anos, lápis de cor e caneta hidrocor sobre sulfite


Ambos os desenhos acima foram feitos pela mesma criança com dois anos de intervalo, e é possível compará-los porque mostram a visão de figura humana.
A influência das vivências culturais que a criança demonstrou em seu segundo desenho podem ser notadas através da colocação de uma placa de endereço, pelo uso do véu transparente na odalisca e na sofisticação dos adereços e penteados.
A cultura influencia as crianças em suas produções, seja na escolha de temas, seja na forma de expressão, pois o repertório visual com o qual a criança tem contato através das apreciações de pinturas, desenhos, esculturas, propagandas, trabalhos dos colegas, etc, serve de referência para suas produções.

A criança age com autoria, criatividade e imaginação, mantendo suas possibilidades de auto-expressão e ao mesmo tempo, agindo informada pela cultura. Esse é o conceito de desenho cultivado proposto pelo livro.

Cabe ao professor, no ensino de arte, propiciar situações nas quais as crianças vivenciem oportunidades de apreciar obras de arte, suas próprias produções e as de seus pares, criar e produzir suas obras, e refletir sobre elas.

Conhecer as características do desenho infantil, como se dá sua gênese e seu desenvolvimento, e como intervir para promover avanços é essencial. Por isso, uma parte do livro traça um panorama conceitual das principais idéias sobre o desenvolvimento do desenho na infância.

O desenvolvimento do desenho

A autora propõe a compreensão do desenvolvimento do desenho não por fases, como se fossem fechadas e progressivas e ocorressem conforme o amadurecimento da criança, mas através de momentos conceituais, o que implica em considerar, além de uma base genética do desenvolvimento cognitivo (vista como possibilidade, e não como determinação), as oportunidades educativas vividas pela criança na construção de seu conhecimento sobre arte.
Essa visão desloca radicalmente o eixo do trabalho, que não está posto sobre a criança ou sobre o conhecimento, mas sim sobre a relação da criança com o objeto de conhecimento. Nessa proposta, o papel do professor é o de promover situações de aprendizagem onde as crianças coloquem em jogo todos os seus conhecimentos prévios, tenham uma situação-problema para resolver e sejam desafiadas e incentivadas a pensar sobre o conteúdo e também sobre o conhecimento.
O desenho é visto como uma das linguagens da criança cujo desenvolvimento depende das experiências de aprendizagem que vivenciam.

Uma leitura contemporânea de Piaget permite que se afirme que as estruturas por eles propostas são possbilidades, na medida em que “nos fazem iguais pelas tendências cognitivas e diferentes ao mesmo tempo pelas marcas culturais”.
O livro recupera idéias de alguns teóricos que dedicaram-se à compreensão da evolução do desenho infantil, tais como Franz Cisek, Viktor Lowenfeld, George-Henri Luquet, Florence de Mèridieu, Rhoda Kellogg, discorrendo sobre suas principais idéias e contribuições à compreensão que atualmente temos do percurso criador desenvolvido pelas crianças ao desenhar.

Bases Teóricas Contemporâneas

Em função do espaço resumido desta resenha, passo a enumerar algumas idéias propostas neste livro e seus teóricos:

Elliot Eisner:
Propõe o uso de imagens no ensino do desenho.
Defende que os modos como as crianças se expressam nas artes visuais depende de habilidades cognitivas adquiridas, influenciadas por habilidades aprendidas e tendências biológicas.
Enumera as habilidades dinâmicas envolvidas no desempenho em artes: desenvolvimento, situação e habilidades cognitivas.
O papel do professor é o de projetar situações que promovam o desenvolvimento dessas habilidades.

Fernando Hernandez:
Vê o ensino de arte como cultura visual, com foco na consciência crítica, na função social das imagens e na história do olhar.
Relaciona a educação em artes e a formação pessoal como um todo.
Propõe uma educação para a diversidade, através de projetos de trabalho interdisciplinares que trabalham competências, habilidades e valores, preservam o significado social e o sentido para o aprendiz.
Tem como objetivos favorecer o conhecimento para a compreensão do mundo, o desenvolvimento físico e o desenvolvimento criativo.
Faz uso das tecnologias de comunicação e informação, considera a diversidade dos estudantes e os interesses individuais, promove aprendizagens colaborativas e socialização.

Kerry Freedman
A educação em artes visuais ocorre dentro e fora da escola, no campo da cultura visual, por todos os ciclos escolares
O contato com objetos, idéias, crenças e práticas de nossa experiência visual formam nosso pensamento sobre o mundo e nos habilitam a incorporar novos conhecimentos.
Os saberes são históricos.
Os alunos formam uma comunidade interpretativa.
Os conhecimentos são produzidos em contextos de interpretação e representação, e são ressignificados pelos aprendentes.
Incorpora a teoria vigotskiana e as novas leituras de Piaget, que relaciona, as aprendizagens aos contextos culturais onde ocorrem.

A intervenção educativa

Em uma perspectiva atual de arte-educação, apoiando-nos nas idéias e descobertas dos teóricos anteriormente citados, temos um papel importante na proposição de situações de aprendizagem que permitam às crianças avançarem em seus conhecimentos sobre arte.

Muito mais do que assistir passivamente o amadurecimento da criança rumo a níveis posteriores de elaboração cognitiva, ou do que propor exercícios de cópia e repetição para que as crianças introjetem o conhecimento, o professor, como mediador entre a criança e o conhecimento, propositor de situações-problema e facilitador das aprendizagens deve planejar, realizar e avaliar as atividades colocadas aos alunos de forma que possam mobilizar seus conhecimentos prévios, resolver desafios propostos, compartilhar idéias, cooperar e colaborar, construir novos conhecimentos e apresentá-los aos seus pares.
Para estar à altura desse papel, o professor deve ter um sólido conhecimento sobre o desenvolvimento infantil como um todo e em artes especificamente, e desenvolver o hábito de observar, documentar e analisar as interações e produções infantis para agir sobre a sua realidade específica.

Colocando-se continuamente questões e refletindo sobre sua prática, sobre o desenvolvimento de seu grupo de alunos e sobre cada aluno em particular, poderá escolher os caminhos a seguir, as atividades a propor e as decisões a tomar.

Assim, o papel do professor reveste-se de nova importância. Ele não é um mero executor de tarefas, mas alguém que constrói e reconstrói continuamente seu próprio conhecimento didático.

O livro apresenta relatos de experiências vividos pela autora como professora, fornecendo um rico modelo para análise que pode servir de ponto de partida para que o professor desenvolva seus próprios projetos.

Três propostas são sugeridas para favorecer a aprendizagem do desenho: desenhar muito e com freqüência, realizar observações de desenhos de colegas e de produtores de desenhos da comunidade e de outros artistas, e a realização de desenhos de imaginação, de memória e de observação de outros desenhos ou do mundo físico.
Idéias práticas como a construção de um portfólio eletrônico, a retomada de trabalhos após algum tempo, a realização de conversas para compartilhar estratégias desenhistas, a valorização da produção infantil para reforçar a autoconfiança, a proposição de variados suportes e materiais para apoiar a pesquisa em desenho, a realização de oficinas de desenho.

Identifiquei-me bastante com os relatos sobre asseqüências de atividades em desenho: uma que teve por base os trabalhos de desenhos com linhas de Flávio Mota, com quem a autora também tinha um vínculo afetivo, por ter sido sua aluna. Outra de argilogravura e impressão com tinta guache sobre papel. (uma idéia excelente que eu jamais teria antes de ler o livro). Outras propostas de trabalho com fotografia de desenhos sobre a pele e aproximação com a tatuagem.
Como professora e coordenadora pedagógica, também quero compartilhar um pouquinho do que tenho realizado e apoiado em termos de arte-educação, e o meu deslumbramento com o modo das crianças aprenderem e expressarem-se em seus trabalhos. Tomo a liberdade de contar um pouco dessa experiência, tentando estabelecer vínculos com as idéias propostas no livro.
O desenho abaixo foi feito a partir da apreciação de algumas obras de Romero Britto, nas quais a professora propunha questões como: Que formas há nesses trabalhos? Quais cores ele usou? O que o artista fez primeiro? O que vocês acharam dessas obras?A proposta de desenhar com pincel e tinta preta para posteriormente utilizar as cores primárias que, inicialmente, parecia difícil à professora, mostrou-se possível para esta criança, que mostrou na pintura traços semelhantes ao que produzia habitualmente nos desenhos.

Tarsila, 5 anos, guache sobre canson com pincel
Isabela, 6 anos, registro de excursão realizada com a escola. Lápis de cor e caneta hidrográfica sobre sulfite.

A perspectiva retratada nesse desenho, com a professora em pé e de frente para o observador e as crianças sentadas, de costas e com as pernas cruzadas, mostra como esta criança realizou observações de situações vivenciadas, e como pensou sobre as possibilidades de retratar essa realidade. Apesar da aparente fidelidade ao real, nem o gênero das crianças (todas meninas), nem as características físicas de todas, e nem a quantidade são exatas. Aparentemente essas questões não foram tão importantes para a criança quanto as formas que buscou expressar, que dominaram seu interesse. Esse é um desenho de memória.

“Considera-se que, ao desenhar, a criança use cognição e sensibilidade e mais a experiência que tem diretamente com desenho no contexto sócio-histórico e cultural em que vive, por si ou com mediação de outros (crianças e adultos). Não se deve deixar de observar que o fato de a criança sofrer influência das culturas, fenômeno incorporado pelas didáticas contemporâneas da arte, não significa perda de liberdade de seleção e escolha do sujeito criador nos atos de aprendizagem. Em outras palavras, não se trata de aprender a desenhar relendo ou copiando modelos de imagens da arte, ou seguindo passos impostos pelo professor para aprender a fazer determinados desenhos, mas de assimilá-los aos próprios esquemas desenhistas, no contato com os códigos da linguagem, gerados nas diferentes culturas e épocas, em sua abertura à singularidade dos desenhistas individuais, que se denvolvem seus percursos de criação pessoal, agora informados pelas culturas”

É comum propor às crianças o desenho da família, pois além do interesse que as crianças têm em representar aquilo que lhes é afetivamente significativo, esta é uma maneira de incentivar o desenvolvimento do desenho da figura humana. Nesses desenhos frequentemente se percebe que a proporção é medida pelas crianças e, termos afetivos. Nesse caso a menina se representa no centro, usando a mesma cor para si e para a mãe, que desenha maior do que o pai.
Observa-se também a inserção espontânea do alfabeto, que ela copia de um mural na classe, mostrando seu interesse pela linguagem escrita.
Este é um desenho de imaginação.


Tarsila, 5 anos. Lápis de cor e caneta esferográfica sobre sulfite

Em uma série de desenhos de observação do espaço as crianças começaram a desenvolver noção de perspectiva. Nesse desenho é curioso perceber como essa noção se mistura à idéia de transparência, característica do desenho infantil observada por Lowenfeld.

As crianças se preocupam com a leitura que o outro faz de sua obra, e esforçam-se para tornar inteligíveis suas idéias. Em rodas de apreciação de trabalhos das crianças podemos notar como cada produção influencia as demais: é comum que as crianças imitem umas às outras tanto nos temas que escolhem quanto nas tentativas de representar suas idéias. A imitação é um recurso cognitivo para o aprendizado. Ao ver um colega desenhar um objeto de determinada maneira e tentar imitá-lo, a criança experimenta formas diferentes de representar, enriquecendo suas habilidades. Não se trata aqui de uma mera cópia do modelo do outro, mas sim de uma tentativa de representar de uma outra maneira, como se com o olhar do outro.
As crianças valorizam as formas, a simetria, as cores. As vivências e experiências de desenho que têm dentro e fora da escola lhes permitem ampliar suas possibilidades de expressão e desenvolver características pessoais que são identificáveis por seus professores e colegas.

"Opera-se com o outro para jogar, ler desenhos, mostrar desenhos e o outro é também o interlocutor, ou destinatário imaginário, dos desenhos que a criança realiza”

As crianças frequentemente dedicam-se a seus desenhos com afinco, seriedade, concentração. Levam muito a sério suas produções, querem vê-las respeitadas e gostam de expô-las e falar sobre elas. Isso porque sabem que seu desenho é de fato importante.
A autora conclui seu texto falando sobre a valorização do desenho na escola, advinda do reconhecimento, também por parte dos adultos, de sua importância para o desenvolvimento do ser humano como um todo.

Destaca que todos podem aprender a desenhar, e que “Cabe à escola abrir o leque no ensino das diversas áreas de conhecimento. Situamos a área de arte que, entre outras linguagens, circunscreve a aprendizagem do desenho que, aprendido na escola, certamente promoverá a participação cultural dos alunos e a interação com a diversidade das culturas”

Para mim foi uma experiência de aprendizagem muito significativa participar das aulas, ler os textos e pensar sobre minha prática como educadora. Meu olhar será outro daqui para frente, mais crítico, informado e embasado teoricamente, e espero poder contribuir para uma educação em arte melhor.

Fiz duas perguntas sobre desenho às minha filhas. Eis as respostas:

O que é desenho?

•Desenho é uma coisa que não é rabisco nem escrita (Isabela, 7 anos)

•É uma coisa que as crianças gostam de fazer no papel, e que pode usar giz de cera, lápis, canetinha, e com carvão, e com tinta e com a mão. (Tarsila, 5 anos)

Por que a gente desenha?

•As pessoas gostam de desenhar, mas tem alguns que não gostam. Eu gosto porque algumas vezes pode fazer um desenho para dar de presente para sua mãe, ou pode escrever um cartão, uma carta. Eu gosto de desenhar uma cidade, uma natureza, uma casa, cachorro, sapo, eu gosto de desenhar tudo. Quando é pintura não é pra desenhar, é pra pintar. (Tarsila, 5 anos)

•Eu desenho porque eu tenho vontade de desenhar, porque é legal, porque não é uma obrigação, a gente desenha se a gente quer. (Isabela, 7 anos)

Esta resenha foi escrita como trabalho da disciplina "Fundamentos do Ensino da Arte", sob responsabilidade da Profa. Rosa Iavelberg, no curso de Especialização em Linguagens das Artes, em abril de 2007.







Um comentário:

isabella disse...

Estou terminando o mesmo curso no CEUMA, caí aqui por acaso e achei esta reunião no artigo excelente.

Vou voltar.

Até mais!

isabella
http://www.isabellices.com