terça-feira, 30 de setembro de 2008

Estudo das Cores

Estudo das cores

Eu estava cansada. Mil coisas para fazer. Acabara de entregar um quadro para exposição, e já estava pensando em como resolver a decoração do atelier. Ainda tinha a entrevista no canal 36. E a reunião sábado? Militância artística na quarta. Aluna nova que vem de Botafogo. Turma iniciando em Santa Rosa. Saiu em que jornal mesmo, hein? Tenho que comprar material pra grafitar o Abrigo. Pegar autorização para levar os alunos. Será que cabe todo mundo numa van?

Assim estava minha cabeça enquanto eu saía do Horto Viveiro na UFF. Peguei a litorânea, desci a pé. Passei pela Praia da Boa Viagem, cheguei no MAC, e segui descendo. Então, de repente fui acometida de um êxtase artístico. Dei-me conta de que estava andando a pé, de chinelo de dedo, numa tarde ensolarada, na Beira da Praia. A onda batia tão perto do calçadão que respingava no meu rosto.

Então tentei continuar com meus pensamentos, mas não dava para ignorar o mar à minha frente. As ondas batiam no calçadão como se me provocassem: "Ei, vem aqui”. Então esqueci de todas aquelas coisas na minha mente e fiquei observando o sol, o mar, o céu azul. O vento gelado na minha pele, o barulho do mar. Fiquei emocionada. E em silêncio comigo mesma. As milhões de preocupações na minha mente silenciaram e eu só ouvi o mar.

Então comecei a ter o desejo de compartilhar aquilo com meus alunos. Imaginei. Eu podia ministrar o estudo das cores do Israel Pedrosa, aqui. Falar sobre a cor inexistente ali no MAC. Branco daquele jeito, vai ser fácil observar cores inexistentes ali. Depois a gente desce e olha as ondas. Quantos tons de azul têm nas ondas de um dia ensolarado? Além dos verdes, cinzas e também os marrons da areia. E o “Marrom Van Dick” da Pedra de Itapuca? Os edifícios me inspiram para um abstrato. E as texturas? Eu podia pedir-lhes para pintar o som das ondas da Praia da Boa Viagem, que não é o mesmo som da Praia de Icaraí.

Então, com tudo isso me maravilhando, a uns cinco metros de mim, uma onda explodiu nas pedras e criou um maravilhoso arco-íris diante de meus olhos. E as ondas seguintes também. Uau! Que estudo de cores maravilhoso: Cores dióptricas. Lembrei de Descartes: "A luz é uma matéria fina e sutil que se propaga por toda a parte e que fere nossos olhos. As cores são sensações que Deus excita em nós, segundo os diversos movimentos que trazem essa matéria aos nossos órgãos”. Mas Deus provocaria novamente aquele arco-íris ali? Talvez eu não possa mostrá-los ali a cor dióptrica, mas apenas a inexistente, e as outras mais simples de achar. Que importa? O mar continua batendo.

Voltei aos meus pensamentos. Será que consigo um ônibus para levar as 6 turmas na praia? Será que vão liberar? Preciso conseguir um passeio no museu e depois na praia em dia de semana, que é mais vazio. Preciso pegar autorização para levar os alunos. Será que cabe todo mundo numa van?

A hora do recreio acabou.

Levantei e fui para casa.

Lya Alves
Projeto Philosoffiti
http://graffitievangelista.blogspot.com
lyamac76@yahoo.com.br

domingo, 28 de setembro de 2008

Metodologia Zig Zag, texto de Ana Mae Barcosa

Recebi esse texto de uma colega virtual, e como gostei muito, compartilho com vocês.
É uma atualização da abordagem triangular no ensino de artes.
Um abraço,
Selma

ZIG/ZAG, Arte/Educação e mediação

Ana Mae Barbosa.

Arte/Educação é principalmente mediação entre Arte e público. Portanto, compreende o esforço de um mediador ou educador em facilitar, estimular, ampliar o conhecimento da Arte pelo público. Este esforço exige um vasto conhecimento da Arte e pelo menos um conhecimento bem embasado de como a mente trabalha em direção a apreensão da imagem e dos processos mentais envolvidos na sua produção.

Recentes pesquisas sobre cognição (Efland, 2002) têm demonstrado a importância do engajamento das crianças e adolescentes nas artes para desenvolver a inteligência, o pensamento reflexivo e a capacidade de investigar e analisar o mundo ao redor. Estas pesquisas vieram resgatar a Arte na educação da 'lamúria psicologizante' e do sentimentalismo diluidor.

Entretanto, não é qualquer abordagem metodológica que desenvolve os processos mentais envolvidos na decodificação e na produção da Arte. Certamente as imagens para colorir de péssimo padrão estético ou os exames que pretendem comprovar se os alunos memorizaram nomes de artistas, suas vidas, ismos e datas não desenvolvem a capacidade de pensar.
A Pedagogia Questionadora têm sido um bom caminho para potencializar a curiosidade e a formulação de significados por crianças, adolescentes e adultos. Contudo, mesmo esta Pedagogia tem sido banalizada não atingindo as plenas possibilidades e os múltiplos significados da obra e do campo de sentido da Arte, restando no obviismo.

O DIÁLOGO é a força motriz da Pedagogia Questionadora, um diálogo que não se limite a roteiros preestabelecidos, um diálogo no qual não há resposta certa nem errada. Podemos julgar qual a interpretação mais adequada ou menos adequada em função do objeto ou idéia analisada. Podemos avaliar o que em termos de atribuição de significado se confirma objetivamente na obra ou o que é produto da elocubração do observador, que mesmo assim não deve ser descartado pelo professor, mas levado à confirmação diante da imagem.

O diálogo frente à obra é o melhor antídoto contra a 'cultura do silêncio' das escolas e museus na qual somente vicejam a prepotência, o autoritarismo e a hipocrisia.

Além do diálogo questionador e propositor de variáveis temos trabalhado com a Proposta ou Abordagem Triangular que compreende as ações de fazer, ver e contextualizar . Esta abordagem metodológica vem sendo transformada nos últimos quinze anos pela ação recriadora de professores e pesquisadores.

Hoje a metáfora do triângulo já não corresponde mais à sua estrutura. Nos parece mais adequado representá-la pela figura do zig-zag pois os professores nos têm ensinado o valor da contextualização tanto para o fazer como para o ver. O processo pode tomar diferentes caminhos /CONTEXTO\FAZER/CONTEXTO\VER ou VER/CONTEXTUALIZAR\FAZER/CONTEXTUALIZAR\ ou ainda FAZER/CONTEXTUALIZAR\VER/CONTEXTUALIZAR\

Assim o contexto se torna mediador e propositor, dependendo da natureza das obras, do momento e do tempo de aproximação do fruidor, enfim da unidade 'subjetil' (sujeito + objeto).
O programa Diálogos e Reflexões é um espaço proposto aos educadores para pensar juntos acerca da Arte e da Arte/Educação. A idéia é que este diálogo estabelecido entre parceiros, mediadores e em presença da própria arte provoque reflexões que nos ajude a encontrar respostas às questões que permeiam as práticas educativas. Questões que muitas vezes levam a outras questões, que nos fazem refletir sobre nossas concepções e a de nossos alunos. Estas reflexões podem nos ajudar a encontrar caminhos para aproximar a Arte da Educação ou aclarar nosso papel como educadores e mediadores da Arte na Educação.

Quando você escuta a palavra Arte em que objetos e idéias você pensa? E seus alunos?
Muito já se ouviu falar nas relações entre Arte e sagrado, espiritualidade e Arte, transcendência e Arte e ultimamente em Arte e conhecimento. Quais destas idéias tem maior peso no modo como você ensina arte?

De que maneira a Arte pode ser integrada em um currículo? Qual a diferença entre integração e interdisciplinaridade?

Como tornar relevante e significativo para os alunos o conhecimento da arte pré-histórica do Brasil, por exemplo?

O que os alunos podem aprender estudando obras de arte contemporâneas?

Que espécie de informação é necessária para entendermos uma obra de arte?

Que papel tem a memória na construção de identidades culturais e pessoais?

De onde você imagina que os artistas tiram suas idéias? E seus alunos de onde tiram as suas idéias para os trabalhos de Arte?

Você acha que o trabalho das crianças pode ser qualificado como arte? Porque?

Hoje, não só a imagem da Arte, mas a Cultura Visual em geral é importante ser vista criticamente. Neste sentido, além de obras de Arte, toda e qualquer peça gráfica pode ser objeto de análise com os alunos. Que tal começar analisando os materiais gráficos produzidos e distribuídos pelo CCBB-SP?

Qual o seu papel numa visita de sua classe a um museu ou centro cultural e qual o papel do educador do museu?

Referências

BARBOSA, Ana Mae (Org.). Inquietações e mudanças no ensino da arte. São Paulo: Cortez, 2002.
______. (Org.). Arte/Educação Contemporânea: consonâncias internacionais. São Paulo: Cortez, 2005.

EFLAND, Arthur. Art and cognition. New York: Teachers College, 2002.

FREEDMAN, Kerry. Teaching visual culture: curriculum, aesthetics and the social life of art. New York: Teachers College, 2003.

Eu e meus cacarecos artísticos somos bem vindos... A recíproca é verdadeira!


Quero destacar de forma muito simples e direta que o comprometimento com a Educação que Selma Moura tem é mote para que nós profissionais da Educação articulemos nossas críticas, nossos anseios e sobretudo nossas contribuições nesse canal virtual.

Interagir assim já é valioso, tendo profissionais desse gabarito como debatedores é privilégio!
Estou certo que o convite se estende aos demais colegas egressos do Curso de Pós Graduação Em Linguagens da Arte da USP, generosamente colaboradores em potencial.

Eu e meus cacarecos artísticos somos bem vindos... A recíproca é verdadeira!

Abraços Artísticos!

Tiago Ortaet

Resenha Ilustrada do livro "O desenho cultivado na criança"

O Desenho Cultivado na Criança: prática e formação de educadores, de Rosa Iavelberg, ed.Zouk, 2006- uma resenha ilustrada

Por Selma de Assis Moura
Especialização em Linguagens da Arte
Centro Universitário Maria Antonia - USP
Sobre a forma desta resenha:

Diante da proposta de fazer uma resenha sobre um dos textos que trabalhamos nas primeiras aulas do curso de Especialização em Linguagens das Artes, escolhi falar de seu livro “O Desenho Cultivado da Criança: prática e formação de educadores”.
Essa leitura veio ao encontro do meu interesse em aprender mais sobre o desenvolvimento do desenho na criança, desafiada pelas produções de meus alunos na educação infantil e de minhas filhas. Esse texto me deu uma base teórica para melhor compreender o que acontece com as crianças em seu processo de criação no desenho e quais são as possibilidades de trabalho do professor, que foi aprofundada nas aulas teóricas que tivemos e na leitura mais detida que fiz depois.

Tomei a liberdade de escrever esta resenha ilustrando-a com alguns dos muitos desenhos que tenho colecionado, e algumas observações pessoais que tenho feito a partir da tentativa de ler esses desenhos com uma maior profundidade. Espero que possamos estabelecer uma troca e um diálogo sobre esses desenhos e minhas reflexões.
Observação importante: Trechos do livro são colocados sob a forma de citações, marcadas em itálico e em cor cinza, para facilitar a visualização e organizar o texto sob a forma de um diálogo com as idéias da autora.

O "Desenho Cultivado"

A palavra ‘cultivado’ no título do livro remete-se à noção de cultura como a de semear, arar, adubar, cuidar e colher, e é ilustrativa da linha que o texto segue: superando a visão tradicional de ensino de arte como mero domínio de técnicas e cópia de modelos, e a visão escolanovista de livre expressão e espontaneísmo, a tese do livro é a de propor uma arte-educação que leve em conta as experiências prévias do aluno, sua vivência cultural, seu conhecimento de mundo, suas habilidades e necessidades, e ajude-o a avançar em seus conhecimentos, "caminhando de níveis de menos saber para níveis de mais saber".
A feliz escolha do termo ‘cultivar’ ilustra bem o trabalho do professor nessa proposta: o de conhecer bem o solo, semear conhecimentos e vê-los crescer e frutificar. Nem tudo está sob seu controle: há o clima, as pragas, os imprevistos. Mas se ele tem conhecimento de seu ofício, muito pode fazer: corrigir o solo, retirar as pedras, criar um sistema de irrigação, colher no tempo certo.

Não há um fruto igual a outro, ainda que todos sejam bons e saborosos. E cada fruto carrega consigo a semente, capaz de gerar outras árvores, outras vidas, em um ciclo cujo fim o semeador sequer vislumbra...

“ Desde a educação infantil podemos propiciar um universo rico de aprendizagens em desenho, expandindo o universo cultural das crianças, trabalho que pode seguir orientado pelas idéias em ação das crianças. Essas idéias, motores dos atos de desenho, são construídas, primordialmente, na prática desenhista e na interação de cada um com a diversidade dos desenhos presentes nos ambientes.”

Na introdução do livro propõe-se uma visão do desenho infantil que foge da idéia de dom, talento ou aptidão, esclarecendo a opção por uma visão construtivista do desenho como “objeto simbólico e cultural, expressivo e construtivo, individuado e influenciado pela cultura”, acessível a todos através do ensino-aprendizagem, que caminha “do pré-simbolismo à construção de poéticas próprias, com marca pessoal e diversidade cultural”. Traça-se um contexto histórico do ensino de desenho na escola, contrastando duas visões: a tradicional e a renovada, com idéias que podem ser sintetizadas no esquema abaixo:

Tendência Tradicional:
Calcada na concepção neoclássica.
Propostas de desenho natural, decorativo, geométrico e pedagógico (para ilustrar aulas)
Didática de cópia de modelos e treino de habilidades, exercícios para fixar pela repetição e aprimorar a destreza motora.
Passos de progressão sucessiva, do mais fácil para o mais difícil, do simples para o complexo.
Não se consideram as diferenças individuais
Ensino centrado na autoridade do professor
Conteúdos: noções de proporção, composição, teoria da luz e sombra, texturas, perspectiva.
Ênfase no produto.

Tendência Renovada
Concepção de desenho como atividade expressiva, livre, e natural da infância;
Didática de exploração livre de materiais e técnicas
Estímulo à imaginação e à criatividade
Liberdade compreendida como qualidade livre de influências do meio
Pensar, sentir e perceber.
Ensino centrado no indivíduo.
Ênfase no processo e no desenvolvimento do potencial criador
Nesse capítulo faz-se também um apanhado histórico dos congressos internacionais de desenho presente na obra Estética e Pedagogia, de Irena Wojnar, que mostra como as concepções de desenho e de seu ensino foram evoluindo ao longo do século XX, rompendo com uma visão onde o aprendizado se dá por introjeção de modelos sem interpretações ou transformações pessoais a um trabalho de criação pessoal. Uma das conquistas destacadas é a visão de erro na produção infantil, que passa a ser considerado parte do processo de desenvolvimento e não como algo a ser corrigido pela intervenção do adulto. Outra conquista é a noção de uma educação estética, ideal da escola renovada e que se torna paradigma para a formação geral do indivíduo.A psicologia e o estudo psicológico do desenho da criança, a partir da segunda metade do século XIX, permitiu que avançássemos em nossa concepção do desenho infantil sob uma perspectiva de criação e de jogo. Com base em Piaget, o texto explicita alguns conceitos de desenvolvimento infantil e seu reflexo na produção dos desenhos:




No período sensório-motor a inteligência da criança é eminentemente prática, a criança assimila o mundo através de suas percepções e não há ainda a possibilidade de representação. Sua produção gráfica expressa o jogo de exploração e imitação que é a pré-figuração. Aos poucos a criança torna-se mais consciente da ligação entre os seus movimentos e os traços no papel, o que a estimula a variar esses movimentos.

"No final do período sensório-motor, segundo Piaget, surge uma função que autoriza representar, tomar uma coisa por outra, diferenciar um significado (coisa, objeto, acontecimento) de um significante (sua representação – linguagem, gesto, imagem mental). O desenho, enquanto símbolo, é representação singular, como o desenho de uma cadeira, feito por uma criança.(...) No sensório-motor a criança não sabe representar, sua inteligência é prática, sabe fazer, age no plano do êxito.”

Figura 2: Tarsila, 3 anos, lápis de cor sobre folha no caderno de desenho


Ao passar das garatujas para as primeiras representações figurativas, a criança mostra uma evolução notável: a percepção de que se pode representar graficamente o real. Ela muda do pensamento cinestésico para o imaginativo, colocando intenção representativa no que desenha, percebendo que outros podem atribuir-lhe significado, e fazendo do desenho uma forma de comunicação com o outro.
"O jogo caminha do jogo de exercício (repetição de ações pelo prazer das sensações e movimentos) para o jogo simbólico, o faz-de-conta que pode ter o corpo como instrumento ou ser projetado em objetos com os quais a criança brinca só ou com seus pares. Na sucessão ocorre o jogo de regras em que os participantes acomodam seus esquemas a uma regularidade que dinamiza a participação de todos”

Os esquemas propostos por Piaget não são sucessivos, mas inclusivos. Em relação ao desenho pode-se dizer que as crianças, mesmo sendo capazes de operar em um nível mais sofisticado, podem sempre recorrer aos níveis anteriores se assim o desejarem. Assim é que Matheus, nesses dois estudos de movimento e formas (desenhos espontâneos feitos por sua escolha em um momento de atividade livre) escolhe não desenhar figurativamente, e uma leitura precipitada poderia ver nesses desenhos garatujas.

A concepção contemporânea de desenho finca suas bases quando, em meados do século XX, psicólogos, antropólogos historiadores, teóricos de arte e educadores partem da documentação e da análise de trabalhos de crianças para, operando em uma perspectiva pedagógica, genética ou psicológica, compreender sua gênese e desenvolvimento. Avançando rumo a pesquisas interculturais e de diálogos dos desenhos com a cultura, começou-se a perceber as constâncias estruturais, ou seja, o que era comum aos desenhos de crianças de vários lugares e tempos, e também as diferenças simbólicas que esses desenhos traziam, delineando as teorias que atualmente sustentam o ensino de desenho.A concepção de desenho na escola contemporânea ou construtivista, defendida pelo livro, parte das necessidades e interesses da criança mas inclui em seu universo a cultura, sem que com isso ela perca sua autoria, seu protagonismo. Através do conhecimento da realidade a criança reelabora seus próprios conhecimentos. Ao dialogar o outro, suas idéias e experiências (seja este outro o colega ao seu lado, o professor ou um artista que se estuda) a criança tem a oportunidade de comunicar suas idéias, ouvir as dos outros, repensar suas próprias idéias e reelaborá-las, avançando assim para um conhecimento mais sólido, sem perder sua marca pessoal.


“Além do conhecimento de si mesma, que a criança tem ao desenhar, ganha compreensão do mundo. Ela desenha porque existe desenho no mundo. Aprende a ver e a executar o que vê. Tende a assimilar níveis de conhecimento e produção artística e estética cada vez mais complexos, agindo sobre os objetos de conhecimento (desenhos) de diversas culturas, tempos e lugares.”


Isabela, aos 5 anos, lápis de cor sobre cartolina

Isabela, aos 7 anos, lápis de cor e caneta hidrocor sobre sulfite


Ambos os desenhos acima foram feitos pela mesma criança com dois anos de intervalo, e é possível compará-los porque mostram a visão de figura humana.
A influência das vivências culturais que a criança demonstrou em seu segundo desenho podem ser notadas através da colocação de uma placa de endereço, pelo uso do véu transparente na odalisca e na sofisticação dos adereços e penteados.
A cultura influencia as crianças em suas produções, seja na escolha de temas, seja na forma de expressão, pois o repertório visual com o qual a criança tem contato através das apreciações de pinturas, desenhos, esculturas, propagandas, trabalhos dos colegas, etc, serve de referência para suas produções.

A criança age com autoria, criatividade e imaginação, mantendo suas possibilidades de auto-expressão e ao mesmo tempo, agindo informada pela cultura. Esse é o conceito de desenho cultivado proposto pelo livro.

Cabe ao professor, no ensino de arte, propiciar situações nas quais as crianças vivenciem oportunidades de apreciar obras de arte, suas próprias produções e as de seus pares, criar e produzir suas obras, e refletir sobre elas.

Conhecer as características do desenho infantil, como se dá sua gênese e seu desenvolvimento, e como intervir para promover avanços é essencial. Por isso, uma parte do livro traça um panorama conceitual das principais idéias sobre o desenvolvimento do desenho na infância.

O desenvolvimento do desenho

A autora propõe a compreensão do desenvolvimento do desenho não por fases, como se fossem fechadas e progressivas e ocorressem conforme o amadurecimento da criança, mas através de momentos conceituais, o que implica em considerar, além de uma base genética do desenvolvimento cognitivo (vista como possibilidade, e não como determinação), as oportunidades educativas vividas pela criança na construção de seu conhecimento sobre arte.
Essa visão desloca radicalmente o eixo do trabalho, que não está posto sobre a criança ou sobre o conhecimento, mas sim sobre a relação da criança com o objeto de conhecimento. Nessa proposta, o papel do professor é o de promover situações de aprendizagem onde as crianças coloquem em jogo todos os seus conhecimentos prévios, tenham uma situação-problema para resolver e sejam desafiadas e incentivadas a pensar sobre o conteúdo e também sobre o conhecimento.
O desenho é visto como uma das linguagens da criança cujo desenvolvimento depende das experiências de aprendizagem que vivenciam.

Uma leitura contemporânea de Piaget permite que se afirme que as estruturas por eles propostas são possbilidades, na medida em que “nos fazem iguais pelas tendências cognitivas e diferentes ao mesmo tempo pelas marcas culturais”.
O livro recupera idéias de alguns teóricos que dedicaram-se à compreensão da evolução do desenho infantil, tais como Franz Cisek, Viktor Lowenfeld, George-Henri Luquet, Florence de Mèridieu, Rhoda Kellogg, discorrendo sobre suas principais idéias e contribuições à compreensão que atualmente temos do percurso criador desenvolvido pelas crianças ao desenhar.

Bases Teóricas Contemporâneas

Em função do espaço resumido desta resenha, passo a enumerar algumas idéias propostas neste livro e seus teóricos:

Elliot Eisner:
Propõe o uso de imagens no ensino do desenho.
Defende que os modos como as crianças se expressam nas artes visuais depende de habilidades cognitivas adquiridas, influenciadas por habilidades aprendidas e tendências biológicas.
Enumera as habilidades dinâmicas envolvidas no desempenho em artes: desenvolvimento, situação e habilidades cognitivas.
O papel do professor é o de projetar situações que promovam o desenvolvimento dessas habilidades.

Fernando Hernandez:
Vê o ensino de arte como cultura visual, com foco na consciência crítica, na função social das imagens e na história do olhar.
Relaciona a educação em artes e a formação pessoal como um todo.
Propõe uma educação para a diversidade, através de projetos de trabalho interdisciplinares que trabalham competências, habilidades e valores, preservam o significado social e o sentido para o aprendiz.
Tem como objetivos favorecer o conhecimento para a compreensão do mundo, o desenvolvimento físico e o desenvolvimento criativo.
Faz uso das tecnologias de comunicação e informação, considera a diversidade dos estudantes e os interesses individuais, promove aprendizagens colaborativas e socialização.

Kerry Freedman
A educação em artes visuais ocorre dentro e fora da escola, no campo da cultura visual, por todos os ciclos escolares
O contato com objetos, idéias, crenças e práticas de nossa experiência visual formam nosso pensamento sobre o mundo e nos habilitam a incorporar novos conhecimentos.
Os saberes são históricos.
Os alunos formam uma comunidade interpretativa.
Os conhecimentos são produzidos em contextos de interpretação e representação, e são ressignificados pelos aprendentes.
Incorpora a teoria vigotskiana e as novas leituras de Piaget, que relaciona, as aprendizagens aos contextos culturais onde ocorrem.

A intervenção educativa

Em uma perspectiva atual de arte-educação, apoiando-nos nas idéias e descobertas dos teóricos anteriormente citados, temos um papel importante na proposição de situações de aprendizagem que permitam às crianças avançarem em seus conhecimentos sobre arte.

Muito mais do que assistir passivamente o amadurecimento da criança rumo a níveis posteriores de elaboração cognitiva, ou do que propor exercícios de cópia e repetição para que as crianças introjetem o conhecimento, o professor, como mediador entre a criança e o conhecimento, propositor de situações-problema e facilitador das aprendizagens deve planejar, realizar e avaliar as atividades colocadas aos alunos de forma que possam mobilizar seus conhecimentos prévios, resolver desafios propostos, compartilhar idéias, cooperar e colaborar, construir novos conhecimentos e apresentá-los aos seus pares.
Para estar à altura desse papel, o professor deve ter um sólido conhecimento sobre o desenvolvimento infantil como um todo e em artes especificamente, e desenvolver o hábito de observar, documentar e analisar as interações e produções infantis para agir sobre a sua realidade específica.

Colocando-se continuamente questões e refletindo sobre sua prática, sobre o desenvolvimento de seu grupo de alunos e sobre cada aluno em particular, poderá escolher os caminhos a seguir, as atividades a propor e as decisões a tomar.

Assim, o papel do professor reveste-se de nova importância. Ele não é um mero executor de tarefas, mas alguém que constrói e reconstrói continuamente seu próprio conhecimento didático.

O livro apresenta relatos de experiências vividos pela autora como professora, fornecendo um rico modelo para análise que pode servir de ponto de partida para que o professor desenvolva seus próprios projetos.

Três propostas são sugeridas para favorecer a aprendizagem do desenho: desenhar muito e com freqüência, realizar observações de desenhos de colegas e de produtores de desenhos da comunidade e de outros artistas, e a realização de desenhos de imaginação, de memória e de observação de outros desenhos ou do mundo físico.
Idéias práticas como a construção de um portfólio eletrônico, a retomada de trabalhos após algum tempo, a realização de conversas para compartilhar estratégias desenhistas, a valorização da produção infantil para reforçar a autoconfiança, a proposição de variados suportes e materiais para apoiar a pesquisa em desenho, a realização de oficinas de desenho.

Identifiquei-me bastante com os relatos sobre asseqüências de atividades em desenho: uma que teve por base os trabalhos de desenhos com linhas de Flávio Mota, com quem a autora também tinha um vínculo afetivo, por ter sido sua aluna. Outra de argilogravura e impressão com tinta guache sobre papel. (uma idéia excelente que eu jamais teria antes de ler o livro). Outras propostas de trabalho com fotografia de desenhos sobre a pele e aproximação com a tatuagem.
Como professora e coordenadora pedagógica, também quero compartilhar um pouquinho do que tenho realizado e apoiado em termos de arte-educação, e o meu deslumbramento com o modo das crianças aprenderem e expressarem-se em seus trabalhos. Tomo a liberdade de contar um pouco dessa experiência, tentando estabelecer vínculos com as idéias propostas no livro.
O desenho abaixo foi feito a partir da apreciação de algumas obras de Romero Britto, nas quais a professora propunha questões como: Que formas há nesses trabalhos? Quais cores ele usou? O que o artista fez primeiro? O que vocês acharam dessas obras?A proposta de desenhar com pincel e tinta preta para posteriormente utilizar as cores primárias que, inicialmente, parecia difícil à professora, mostrou-se possível para esta criança, que mostrou na pintura traços semelhantes ao que produzia habitualmente nos desenhos.

Tarsila, 5 anos, guache sobre canson com pincel
Isabela, 6 anos, registro de excursão realizada com a escola. Lápis de cor e caneta hidrográfica sobre sulfite.

A perspectiva retratada nesse desenho, com a professora em pé e de frente para o observador e as crianças sentadas, de costas e com as pernas cruzadas, mostra como esta criança realizou observações de situações vivenciadas, e como pensou sobre as possibilidades de retratar essa realidade. Apesar da aparente fidelidade ao real, nem o gênero das crianças (todas meninas), nem as características físicas de todas, e nem a quantidade são exatas. Aparentemente essas questões não foram tão importantes para a criança quanto as formas que buscou expressar, que dominaram seu interesse. Esse é um desenho de memória.

“Considera-se que, ao desenhar, a criança use cognição e sensibilidade e mais a experiência que tem diretamente com desenho no contexto sócio-histórico e cultural em que vive, por si ou com mediação de outros (crianças e adultos). Não se deve deixar de observar que o fato de a criança sofrer influência das culturas, fenômeno incorporado pelas didáticas contemporâneas da arte, não significa perda de liberdade de seleção e escolha do sujeito criador nos atos de aprendizagem. Em outras palavras, não se trata de aprender a desenhar relendo ou copiando modelos de imagens da arte, ou seguindo passos impostos pelo professor para aprender a fazer determinados desenhos, mas de assimilá-los aos próprios esquemas desenhistas, no contato com os códigos da linguagem, gerados nas diferentes culturas e épocas, em sua abertura à singularidade dos desenhistas individuais, que se denvolvem seus percursos de criação pessoal, agora informados pelas culturas”

É comum propor às crianças o desenho da família, pois além do interesse que as crianças têm em representar aquilo que lhes é afetivamente significativo, esta é uma maneira de incentivar o desenvolvimento do desenho da figura humana. Nesses desenhos frequentemente se percebe que a proporção é medida pelas crianças e, termos afetivos. Nesse caso a menina se representa no centro, usando a mesma cor para si e para a mãe, que desenha maior do que o pai.
Observa-se também a inserção espontânea do alfabeto, que ela copia de um mural na classe, mostrando seu interesse pela linguagem escrita.
Este é um desenho de imaginação.


Tarsila, 5 anos. Lápis de cor e caneta esferográfica sobre sulfite

Em uma série de desenhos de observação do espaço as crianças começaram a desenvolver noção de perspectiva. Nesse desenho é curioso perceber como essa noção se mistura à idéia de transparência, característica do desenho infantil observada por Lowenfeld.

As crianças se preocupam com a leitura que o outro faz de sua obra, e esforçam-se para tornar inteligíveis suas idéias. Em rodas de apreciação de trabalhos das crianças podemos notar como cada produção influencia as demais: é comum que as crianças imitem umas às outras tanto nos temas que escolhem quanto nas tentativas de representar suas idéias. A imitação é um recurso cognitivo para o aprendizado. Ao ver um colega desenhar um objeto de determinada maneira e tentar imitá-lo, a criança experimenta formas diferentes de representar, enriquecendo suas habilidades. Não se trata aqui de uma mera cópia do modelo do outro, mas sim de uma tentativa de representar de uma outra maneira, como se com o olhar do outro.
As crianças valorizam as formas, a simetria, as cores. As vivências e experiências de desenho que têm dentro e fora da escola lhes permitem ampliar suas possibilidades de expressão e desenvolver características pessoais que são identificáveis por seus professores e colegas.

"Opera-se com o outro para jogar, ler desenhos, mostrar desenhos e o outro é também o interlocutor, ou destinatário imaginário, dos desenhos que a criança realiza”

As crianças frequentemente dedicam-se a seus desenhos com afinco, seriedade, concentração. Levam muito a sério suas produções, querem vê-las respeitadas e gostam de expô-las e falar sobre elas. Isso porque sabem que seu desenho é de fato importante.
A autora conclui seu texto falando sobre a valorização do desenho na escola, advinda do reconhecimento, também por parte dos adultos, de sua importância para o desenvolvimento do ser humano como um todo.

Destaca que todos podem aprender a desenhar, e que “Cabe à escola abrir o leque no ensino das diversas áreas de conhecimento. Situamos a área de arte que, entre outras linguagens, circunscreve a aprendizagem do desenho que, aprendido na escola, certamente promoverá a participação cultural dos alunos e a interação com a diversidade das culturas”

Para mim foi uma experiência de aprendizagem muito significativa participar das aulas, ler os textos e pensar sobre minha prática como educadora. Meu olhar será outro daqui para frente, mais crítico, informado e embasado teoricamente, e espero poder contribuir para uma educação em arte melhor.

Fiz duas perguntas sobre desenho às minha filhas. Eis as respostas:

O que é desenho?

•Desenho é uma coisa que não é rabisco nem escrita (Isabela, 7 anos)

•É uma coisa que as crianças gostam de fazer no papel, e que pode usar giz de cera, lápis, canetinha, e com carvão, e com tinta e com a mão. (Tarsila, 5 anos)

Por que a gente desenha?

•As pessoas gostam de desenhar, mas tem alguns que não gostam. Eu gosto porque algumas vezes pode fazer um desenho para dar de presente para sua mãe, ou pode escrever um cartão, uma carta. Eu gosto de desenhar uma cidade, uma natureza, uma casa, cachorro, sapo, eu gosto de desenhar tudo. Quando é pintura não é pra desenhar, é pra pintar. (Tarsila, 5 anos)

•Eu desenho porque eu tenho vontade de desenhar, porque é legal, porque não é uma obrigação, a gente desenha se a gente quer. (Isabela, 7 anos)

Esta resenha foi escrita como trabalho da disciplina "Fundamentos do Ensino da Arte", sob responsabilidade da Profa. Rosa Iavelberg, no curso de Especialização em Linguagens das Artes, em abril de 2007.







Quem tem medo do medo??? Texto poético teatral co-autoria alunos do Ensino Fundamental da Prefeitura de S. Caetano do Sul


ARTE/EDUCAÇÃO EM AÇÃO...

A seguir uma obra poética produzida através de trocas de opiniões, debates, textos e cenas nas aulas de Artes Cênicas que ministro aos alunos de São Caetano do Sul, uma experiência muito significativa na concepção de arte/educação reflexiva com crianças.

Fui o mediador das falas dos alunos e estruturei o texto que inicialmente tinham 10 linhas e a partir disso fomos criando essa história aventureira! Viajamos na fantasia e foi validado planamente o universo infantil... Eles decidriam o início e o fim da história que brevemente se transformará em livro infantil, escrito prioritariamente a apartir do ponto de vista de quem entende bem do assunto: CRIANÇA!

QUEM TEM MEDO DO MEDO???

Otávio é um garotinho muito esperto, mas não sabe ao certo o que está por traz do escuro.
Ele desconfia que seja o gato preto que havia subido em cima do muro.
Ele sabe que no conforto do seu quarto não tem perigo, ele montou uma cabana bacana, cheia de cobertas, essa cabana é seu abrigo, lá é um lugar seguro.
Mas quando chega a noite lá fora vira um lugar escuro. Quem será que mora no escuro?
Otávio pensa em grilos e largatixas, esses bichinhos que vivem no quintal.
No escuro do quintal também moram formiguinhas e cigarras que não fazem nenhum mal.
Certa noite chovia muito, o menino sempre alerta correu pra sua cabana, mas esqueceu a porta aberta e a lanterna em cima da cama.
O vento que balançou a cortina soprou forte e fez um barulhinho...
O garotinho ouviu um grito fino e estridente parecido de menina, correu de volta para seu esconderijo e abraçou seu ursinho.
Era o urso “ALFE” seu protetor, seu amiguinho.
Olhou pela janela e as árvores balançavam na esquina
Otávio preocupado chamou seu papai...
O menino ouviu um uivo de lobo do lado de fora
Tentou acender a luz!
A lâmpada que não acendia
Seus olhinhos arregalados e aquele susto que arrepia
Olhou a hora!
Pensou:
- Meu pai e minha mãe não ouviram muito bem, vou dar um grito!
- Mamãeeeeeeeee!!!!! Papaiiiiiiiiiiiii!
Seus pais chegaram ao quarto assustados
- O que houve filho, por que essa gritaria?
Otávio respondeu:
- Eu estava com medo dos barulhos que estão vindo lá do quintal.
Seu pai teve uma idéia bem legal:
- Meu filho, vou ler para você uma poesia especial.
Há muito tempo atrás um escritor bem divertido inventou essa poesia que parece um samba-enredo, ele ficou escrevendo da noite até no outro dia bem cedo; o nome do livrinho é “Quem tem medo do medo???”

Esses são os versos das crianças corajosas
De crianças inteligentes e cheias de educação
Letras que apresentam histórias caprichosas
Versinhos que parecem uma canção.
Onde moram nossos sentimentos?
Dentro da gente não é Zé Mané?
É o que é! É uma movimentação!
O que tem de bom na nossa imaginação?
O medo é uma ponte quebrada que pode me fazer cair
É uma porta trancada que não me deixa sair
É uma rua não asfaltada que me faz escorregar
É uma escuridão danada que não me deixa enxergar
É uma garota assaltada gritando pra alguém ajudar
Eu tenho medo desses programas que mostram defuntos na TV
Acho que isso é falta de assunto e nem sei pra quê.
Qual é a cor do medo?
Preto, Vermelho, Cinza ou Roxo? É uma cor que nunca vi...
Como ele se apresenta?
Bem devagarzinho, correndo ou coxo? Nem tenho mais medo, acabei de rir...
Que cheiro ele tem? Acho que é fedido...
Ele vem assustando com uma história misteriosa e lenta... Faz meninos e meninas correrem e cada olhinho aumenta!
Meu pedido foi atendido... Não to mais com medo não; percebi que é só apertar a minha mão.
Qual é o jeito que o medo vem?
Jeito esquisito... Mas meu pai já elogiou minha coragem:
- Nossa mas que bonito!
Que forma ele tem?
Parece aquele velhinho lá do armazém...
Como que a gente acaba com o medo de alguém?
Deve ser pensando em coisas boas, eu penso em chocolate, balas, bombons, desenhos e brincadeira, cantiga de roda e ouvir histórias a noite inteira.
O medo é um lugar habitado por quem?
O medo é uma história que ligava a realidade até a imaginação.
Ele vai chegando e mudando a feição?
Não, a minha não!
O medo desperta o ronco das certezas ou alivia o baú da esperteza?
Qual a cor que o medo tem?
Todas juntas?
Qual é a dor que o medo traz?
Todo mundo tem medo ou será que só o neném é que tem?
Até meu pai também se assusta!
Ó meu bem, que mal o medo faz?
Cochichando no ouvido dele,
Diz que vai guardá-lo num baú escondido...
Aposto que ele vai ficar com medo dele mesmo, nesse vai e vem. Medo é apelido!
Quando ele pensar em chegar, você pode se preparar; pegar uma caixinha e colocar o medo dentro, depois coloca-lo do lado de fora.
Aqui ele não vai entrar! Ninguém mais se apavora, por que é hora de poetizar! Versos soltos pra outras histórias contar.
Mas não se esqueça que você tem que todo dia demonstrar...
Os inimigos do medo são o amor, a paz, a alegria, a animação, a educação e a poesia.
Assim ele vai pra bem longe, não vai mais perturbar.
Deixa ele lá, assustado e perdido! Sem saber no que vai dar.
Nada de monstro, nada de bicho fedido, nada de escuro ou assombração!
Nada disso pode ser maior do que a bondade do coração.

*Professor Tiago Ortaet e alunos do 2º ano do Ensino Fundamental - Prefeitura Municipal de São Caetano do Sul
Arte-Educação Para quê? (Razões para ensinar arte)

Selma de Assis Moura
Disponível em: http://www.artenaescola.org.br/pesquise_monografias_texto.php?id_m=241


A educação é uma das ações que definem nossa humanidade: o ser humano transcende seu status animal pois vai além dos instintos: compreende, reelabora, reflete, cria e recria, critica, aprende, ensina. A busca do homem através da história é sempre uma busca de compreender e transformar a realidade.

Já foi dito que uma característica distintiva do ser humano é a necessidade do supérfluo. O que ultrapassa os limites das necessidades básicas essenciais à sobrevivência e coloca-se no campo da atribuição de sentido é o que nos torna humanos. A admiração diante de um por do sol, a necessidade de deixar uma marca que dure além do efêmero tempo de nossa existência, o incômodo diante da desorganização e a valorização de uma certa ordem individual, o espanto diante do inusitado, a apreciação da beleza, a reflexão sobre o que é diferente e nos provoca... todos os seres humanos vivenciam essas situações ao longo de suas vidas, pois são constituídos de dimensões físicas, cognitivas, emocionais, sociais, éticas e estéticas.

Essa característica pluridimensional do ser humano por si só já seria válida para justificar a importância da arte na educação, já que sua ausência não favoreceria um desenvolvimento integral da pessoa, um dos principais objetivos da educação. Mas além desse fator há outros que valem a pena serem lembrados.

A arte é cultura. É fruto de sujeitos que expressam sua visão de mundo, visão esta que está atrelada a concepções, princípios, espaços, tempos, vivências. O contato com a arte de diversos períodos históricos e de outros lugares e regiões amplia a visão de mundo, enriquece o repertório estético, favorece a criação de vínculos com realidades diversas e assim propicia uma cultura de tolerância, de valorização da diversidade, de respeito mútuo, podendo contribuir para uma cultura de paz. O conhecimento da arte produzida em sua própria cultura permite ao sujeito conhecer-se a si mesmo, percebendo-se como ser histórico que mantém conexões com o passado, que é capaz de intervir modificando o futuro, que toma consciência de suas concepções e idéias, podendo escolher criticamente seus princípios, superar preconceitos e agir socialmente para transformar a sociedade da qual faz parte.

Além das já referidas justificativas ontológicas e culturais para a importância da arte na educação, cabe falar da dimensão simbólica da arte, de seu poder expressivo de representar idéias através de linguagens particulares, como a literatura, a dança, a música, o teatro, a arquitetura, a fotografia, o desenho, a pintura, entre outras formas expressivas que a arte assume em nosso dia-a-dia.

Essas formas são linguagens criadas pela humanidade para expressar a realidade percebida, sentida ou imaginada, e como linguagens que são, têm suas próprias estruturas simbólicas que envolvem elementos tais como espaço, forma, luz e sombra em artes visuais, timbre, ritmo, altura e intensidade em música, entre outros elementos inerentes a outras linguagens da arte. Ora, o conhecimento dessas estruturas simbólicas não é evidente aos alunos, nem se constrói espontaneamente através da livre expressão, mas precisam ser ensinados. O ensino das linguagens da arte cabe também à escola, embora não apenas a ela.

Um outro argumento em defesa da arte na educação passa pela sua importância ao desenvolvimento cognitivo dos aprendizes, pois o conhecimento em arte amplia as possibilidades de compreensão do mundo e colabora para um melhor entendimento dos conteúdos relacionados a outras áreas do conhecimento, tais como matemática, línguas, história e geografia. Um exemplo mais evidente é a melhor compreensão da história, de seus determinantes e desdobramentos através do conhecimento da história da arte e das idéias sobre as quais os movimentos artísticos se desenvolveram. Não existe dicotomia entre arte e ciência, entre pensar e sentir, entre criar e sistematizar, e a fragmentação do conhecimento é uma falácia que tem estado presente na educação, devendo ser superada, pois o ser humano é íntegro e total.

Diante de tal importância que a arte assume na educação, pode-se fazer uma revisão crítica do que a escola tem alcançado em termos de ensino da arte.

Temos conseguido valorizar nos alunos sua expressividade e potencial criativo? Temos sabido perceber, compreender e avaliar suas idéias sobre as linguagens artísticas? Temos desenvolvido nosso próprio percurso em artes de tal modo que conheçamos os conteúdos, os objetivos e os métodos para ensinar cada uma das linguagens artísticas? Temos tido suficiente bagagem teórico-conceitual para identificar o momento que cada educando vivencia em sua construção de conhecimento sobre a arte e fazer intervenções que lhe permitam avançar? Temos sabido incentivar a formação cultural de nossos educandos e ajudá-los a perceberem-se como sujeitos de cultura?

Creio que estamos vivenciando um momento histórico de grande importância na educação como um todo e na arte-educação especificamente: o desafio de superar concepções tecnicistas e utilitaristas, mas também de ir além do “deixar fazer” e da livre expressão apenas, para reconhecer que a arte tem características próprias que devem ser melhor conhecidas pelos educadores, que tem objetivos próprios e seus próprios métodos. Será que nós tivemos, em nossa educação, acesso à arte? E que acesso foi esse? Estamos reconstruindo o ensino da arte, não com base no que aprendemos na escola, mas no conhecimento que estamos a construir agora.

Nós, como educadores, precisamos aprender mais para ensinar melhor. Cada um de nós deverá ser um construtor de conhecimentos e um semeador de idéias e práticas que, esperamos, darão frutos no futuro.

Indicações de Leitura:

Derdyk, Edith. Formas de Pensar o Desenho: O desenvolvimento do grafismo infantil. São Paulo, Scipione, 1989.

Iavelberg, Rosa. Para gostar de Aprender Arte: Sala de Aula e Formação de Professores. Porto Alegre, Artmed, 2003.

Iavelberg, Rosa. O desenho Cultivado na Criança: Prática e Formação de Professores. São paulo, Zouk, 2006

Nicolau, Marieta Lúcia Machado e Marina Célia Moraes Dias (orgs). Oficinas de Sonho e Realidade na Formação do Educador da Infância. Campinas, Papirus, 2003.

Encontros artísticos

Bem vindos, colegas e amigos que visitam este espaço virtual!

Quero aqui, nesse ciberespaço, dividir e multiplicar idéias, conhecimentos e experiências sobre o trabalho em artes na escola, com crianças de educação infantil e de ensino fundamental I.

É um desafio que as professoras polivalentes - que não tem formação específica em arte - enfrentam. Nos cursos de pedagogia há disciplinas de metodologia que introduzem a futura professora nesse universo, mas quando chegamos no dia-a-dia da sala de aula.... que fazer?

Por outro lado, há uma rede de arte-educadores que têm conhecimentos aprofundados, e que exercem sua atuação em escolas, museus e instituições culturais, e que tem conhecimentos a compartilhar.

Quem sabe podemos aqui abrir espaço para o encontro entre essas duas realidades: arte-educadores e professores polivalentes?

Venha participar! Seja bem-vindo!

Tarsila, 5 anos, giz de cera e caneta hidrográfica sobre sulfite